Intrigas e Monopólio — Seja bem-vindo à Jamestown, a jóia mais brilhante das Américas - PARTE II

"Existe uma erva chamada uppowoc. Nas Índias Ocidentais ela tem vários nomes, de acordo com os diferentes locais onde é cultivada e consumida, mas os Espanhóis geralmente a chamam de tabaco. Suas folhas são secas, reduzida à pó e depois consumida de forma que o indivíduo deve chupar um cachimbo feito de barro, que levará a fumaça até o seu estômago e cabeça. Os vapores fumegantes se elevam exuberantes e volumosos através dos poros do corpo. É dito que não além de preservar o corpo, também limpa quaisquer obstruções que existirem em seu caminho. Desta forma os nativos se mantém em excelentes condições de saúde, muitos sem as malévolas doenças que nos afligem na Inglaterra."

- Thomas Harriot, matemático, astrônomo e expedicionário inglês em sua publicação: A Brief and True Report of the New Found Land of Virginia (1588)


          Por volta de 1675, a Virgínia já havia se tornado a colônia Britânica mais lucrativa, exportando mais de 10.000 toneladas de Tabaco anualmente. Impostos de importação rendiam à coroa cerca de 100.000£(libra) por ano, um valor que em 1700 poderia ser estimado em 400.000£. Nem mesmo as valiosas colônias açucareiras da Inglaterra nas Índias Ocidentais poderiam produzir tanto lucro. Embora estes ganhos poderiam dificilmente ser comparados com a impressionante fortuna em metais preciosos extraídos pelos Espanhóis um século anterior, de várias formas, o tabaco era o ouro inglês. Piratas estrangeiros espreitavam na costa Americana testando sua sorte ao atacar naus inglesas portando a valiosa planta. Também houve precedentes de navios de guerra Ingleses designados com a tarefa de assegurar passagem segura de frotas de navios mercantes para a Inglaterra.


          Os lucros do tabaco encheram os cofres do Governo Colonial da Virgínia e fez a elite da colônia, a mais bem recompensada das Américas. Os representantes da Casa de Burgesses receberam estipêndios de viagem(uma espécie de bolsa de reparação financeira) 5 vezes maiores que o pago para os outros legisladores da Nova Inglaterra. Em 1675, Virgínia era a grande jóia brilhante dentre as colônias da Coroa Inglesa.


          No entanto a Virgínia não começou de forma tão lucrativa. Na verdade, os primeiros anos da colônia foram miseráveis, marcados por surtos de doença, até mesmo fome. Apenas 38 dos 105 colonos estacionados em Jamestown sobreviveram o primeiro inverno na colônia, em 1607. Dois anos depois, apenas 60 dos 500 habitantes de Jamestown sobreviveram outro inverno, ainda mais rigoroso. Através de toda a década, a colônia falhou miseravelmente, até mesmo na sua própria manutenção e sobrevivência, muito menos em gerar lucros para os investidores da Virginia Company.


Ilustração de Jamestown em 1607.


          Ao se indagar o porquê de tantos desastres, o que se dizia na época era que a os Colonos ali depositados eram extraordinariamente incompetentes e preguiçosos. Um relatório da Virginia Company descrevia a quase universal "apatia e preguiça bestial da população de Jamestown'. George Sandys, o tesoureiro da Companhia escreveu descrevendo os colonos: "A mais amaldiçoada tripulação que o inferno jamais regurgitou."


          Historiadores puderam apurar mais essa explicação ao enfatizar os tipos de colonos que a Companhia depositou em suas colônias em seus primeiros anos. Por causa das ambições de explorar a terra do novo mundo, a Virginia Company enviou uma diversa gama de especialistas e artesões para a colônia, incluindo dois ferreiros, seis tecelões, um joalheiro, um perfumeiro, incluindo uma série de estrangeiros mestres de ofício. Dentre os estrangeiros incluíam apotecários, refinadores de metal, de cobre e até mesmo um fabricante de cachimbos. Nos futuros anos a colônia recrutaria até especialidades mais exóticas como fabricantes de vidro Italianos e refinadores de sal franceses, além de uma diversa variedade de trabalhadores metalúrgicos Alemães e Poloneses.


          Com este corpo altamente especializado(e um tanto não-prático), a companhia também enviou um grande número de 'Gentlemans', aristocratas e magnatas Ingleses. Atraídos pela promessa de aventura e fortunas ainda maiores, 36 destes Cavalheiros seguiram a primeira expedição com 105 colonos. Outros 56 seguiram para a expedição seguinte com 190 colonos. Aristocratas e novos-ricos eram abundantes durante os primeiros anos de Jamestown.


          Em resumo, a nova colônia em Jamestown estava auxiliada por toda sorte de gente, exceto pelo tipo mais necessário, os trabalhadores comuns, fazendeiros que estariam dispostos à despender o trabalho manual necessário para tratar aquela terra e explorar as florestas selvagens da Virginia.


          A "descoberta" do tabaco na Virginia, como foi chamada, não foi bem uma descoberta em si, pois como vimos em nossa postagem anterior, o tabaco já era distribuído na Europa através dos Espanhóis. No entanto, foi John Rolfe(o lendário marido da índia Pocahontas), residente de Jamestown que começou a experimentar plantações em meados de 1612. Foi por volta de 1617 que a produção de tabaco em Jamestown começa a ganhar fôlego, durante a próxima década, os preços da planta aumentariam progressivamente. Cada vez mais ingleses fumavam a erva de forma recreacional, não apenas por seu suposto valor medicinal. Em resultado, literalmente, todas as forças da colônia se voltaram para a produção de tabaco. Terra nos arredores de Jamestown eram abundantes, mas limpar as densas florestas Norte-Americanas para a criação de campos levava tempo, então cada último metro quadrado ao redor de Jamestown foi plantado tabaco. É estimado que um indivíduo que plantava tabaco em Jamestown poderia ganhar cerca de 200£ por ano, quase sete vezes mais que um habilidoso mestre de ofício na Inglaterra. Era estimado que um Colono com cinco ou seis servos poderia ganhar até 1000£ por ano, o que o fazia um homem rico.


Mapa da Virginia, 1612.


          Os estimulantes lucros do tabaco entrariam em colapso em 1630, a enorme produção na Virginia levou à uma queda generalizada de preços na Inglaterra. No entanto, ainda havia dinheiro nas plantações para encorajar sua cultivação. Ao longo do século XVII, a população humana, a produção de tabaco e o mercado Europeu para o tabaco cresceriam de forma aproximadamente sincronizada. O preço do tabaco flutuaria, mas seu preço se manteria em cerca de 2 e 5 pennies(moeda inglesa equivalente à 1.5g de prata) por quilo até 1680.


          À estes preços, os habitantes de Jamestown não iriam se tornar tão ricos quanto foram nos anos próximos à 1620. No entanto, mesmo através do século, estes colonos ainda ganhariam muito mais do que seria esperado lucrar na Inglaterra. Até mesmo a grande quantidade de homens colonos que chegaram na costa como servos, homens que trocaram vários anos de trabalho não-pago em troca de sua passagem para a Virginia, foram capazes de passarem pela servidão até a posse de terras, em sua jornada no comércio de tabaco da Virginia. Nomes de servos rotineiramente podem ser observados em recibos de impostos e decisões do conselho da colônia, evidência que esses servos adquiriram um novo tipo de Status. Tabaco fez a mobilidade econômica e social possível na colônia.


          A plantação de tabaco fez com que Jamestown finalmente alcançasse seu grau de sucesso nas Américas. Não foi exatamente o tipo de sucesso que seus fundadores anteciparam, vide a sorte de trabalhadores primeiramente enviadas ao local. Mas o comércio de tabaco não só ofereceu à chance de sobrevivência para a Virginia, como um tipo de oportunidade de escalada social que seus colonos mais pobres jamais poderiam ter conseguido na Inglaterra. Os lucros da Virginia Company a fizeram uma das companhias de comércio mais bem-sucedidas do mundo, carregando um enorme poder político e econômico que apoiaria a supremacia Britânica nas Américas e contribuiria de forma direta para o acúmulo primitivo de capital já em andamento na época.

Referências:

http://www.ushistory.org/us/2d.asp

https://www.lib.umn.edu/bell/tradeproducts/tobacco

Daudin, Guillaume. Atlantic Trade and European History(2015)

Comentários